segunda-feira, 25 de maio de 2009

Editorial (cont.)



Falta de consensos
É certo que não existe equilíbrio quando está em jogo a gestão de uma cidade e em cima da mesa está a relação entre construção e preservação do património. Em Braga, é impossível chegar a consensos, mesmo entre os próprios arqueólogos.
Mas não será pela falta de instrumentos legais que Câmara Municipal não defende o seu património. Para além de um Gabinete de Arqueologia, dispõe de uma Divisão de Renovação Urbana, onde as regras parecem ser claras: sempre que há intervenções no subsolo, tem de haver escavações arqueológicas. Mais: o Museu de Arqueologia D. Diogo de Sousa é um local de excelência no que à preservação da memória de Braga diz respeito.

Apesar disso, os representantes dos partidos políticos da oposição fazem coro nas críticas ao desempenho da maioria camarária, salientando que os alegados "interesses obscuros" ligados à área da construção civil determinam a acção municipal (ver menu Opinião). A Câmaraa não concorda e diz que o património está a ser utilizado como arma de arremesso político.

Para além dos partidos, o certo é que há pessoas com responsabilidades científicas em Braga que criticam violentamente a política da autarquia, nomeadamente o facto de a gestão ser feita de costas voltadas para os cidadãos, amputando o exercício da cidadania.
As Sete Fontes (ver menu Exemplos) são um bom exemplo que serve para ilustrar toda a situação. O local está semi-abandonado, apesar das chamadas de atenção ao longo dos anos de várias instituições da cidade. De súbito, com a construção do hospital, paredes-meias com o complexo arquitectónico, volta à ribalta a questão da necessidade de preservar o espaço.
Depois de uma marcha da população, surgiu a notícia de que a Câmara de Braga tinha um plano de pormenor para o local que prevê a construção fora da zona de protecção (50 metros para cada lado). O vice-presidente diz que o complexo só existe, porque foi preservado estes anos todos pela autarquia.

O caso das Sete Fontes
O facto é que já foi atingido pelas obras do hospital, provocou a demissão de um arqueólogo, por alegadamente estar a cumprir a lei, e as prospecções arqueológicas que deveriam ter sido feitas antes do novo hospital começar a ser construído serão concretizadas à medida que a construção avança. Para além disso, o espaço vai ser afectado visualmente pelo viaduto que vai surgir para a ligação ao novo hospital.

Trata-se de um local ancestral, onde há água em abundância, que se presume ser anterior à datação do complexo visível (século XVIII), dados os vestígios romanos já encontrados.

Este é o caso do momento. Antes foi a destruição do Castro Máximo para dar lugar a um equipamento desportivo (ver menu Exemplos). Mas este estranho ex-libris assumido pela Câmara e que dá por nome de Bracara Augusta, tem outros aspectos. A falta de sinalização dos vestígios arqueológicos é um deles e parece delirante a explicação de que as placas não são colocadas devido ao ruído visual que iriam provocar. Até que sejam colocados postos de informação multimédia, quem quiser saber onde fica um local de interesse terá de recorrer a outros meios. Depois, não se percebe por que motivo de a Ínsula das Carvalheiras, inteiramente mapeada (ver menu Exemplos), está num estado de semi-abandono, alegadamente por falta de financiamento para um projecto de musealização.

Pão e circo?
A ideia romana de dar pão e circo ao povo, para o entreter e não pensar em coisas mais importantes, parece assentar que nem uma luva a quem gere os destinos de Braga. Interessam é iniciativas como Braga Romana, que recriam a boémia da época e transformam o centro da cidade numa pequena Subura de Roma durante uns dias.

Bracara Augusta deu nome a Braga há 2 mil anos e as marcas romanas que existem são aproveitadas pelo sector privado, que reconhece a importância do nome.
Iniciativas como a Braga Romana são importantes. No entanto, não fazem esquecer que há uma falta clara de investimento estratégico para que Bracara Augusta seja, de facto, considerada um ex-libris pela Câmara.
Bastará ver quanto custou o novo Estádio Municipal que, embora já seja monumento nacional, foi edificado onde antes havia um castro e, ao contrário dos estádios romanos, como o Coliseu de Roma, nem sequer tem bancadas a toda a volta, para perceber qual é, de facto, a prioridade de quem gere os destinos políticos de Braga.


Ricardino Pedro e Vítor de Sousa

Sem comentários:

Enviar um comentário

A Direcção Editorial deste Projecto reserva-se o direito de não publicar os comentários considerados ofensivos.